“E eis que, aproximando-se dele [Jesus] um jovem, disse-lhe: Bom Mestre, que bem farei, para conseguir a vida eterna? E ele lhe disse: Por que me chamas bom? Não há bom, senão um só que é Deus. Se queres, porém, entrar na vida, guarda os mandamentos. Disse-lhe ele: Quais? E Jesus disse: Não matarás, não cometerás adultério, não furtarás, não dirás falso testemunho; honra teu pai e tua mãe, e amarás o teu próximo como a ti mesmo. Disse-lhe o jovem: Tudo isso tenho guardado desde a minha mocidade; que me falta ainda? Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu; e vem e segue-me. E o jovem, ouvindo esta palavra, retirou-se triste, porque possuía muitas propriedades.” Mateus 19.16-22 – Trecho da Bíblia – Edição Revista e Corrigida – João Ferreira de Almeida
Um texto como este pode nos levar a muitas considerações, sobre muitos aspectos do nosso dia-a-dia, mas gostaria de deter-me, nesta oportunidade, sobre o pensamento que tem assomado mente e coração da maioria dos mortais ao longo dos tempos: uma vida que dure para sempre.
Nos dias em que vivemos, quando o ter tornou-se mais importante que o ser e o homem tem se destacado na sociedade pela quantidade de bens que possui, muitos estão investindo tudo o que têm naquilo que é transitório, perecível, esquecendo-se que a justificação está colocada num plano muito mais elevado que este, sendo algo que só será alcançado por aquele que se dispuser, verdadeiramente, a estar em comunhão com Aquele que é justo e perfeito em todos os seus atos – Deus, o Criador e Sustentador de todas as coisas, mediante a fé em Jesus Cristo.
No texto destacado acima, vamos encontrar certo jovem que desejava alcançar a vida eterna, objeto da busca de todos os homens, de todos os tempos. Ele aproximou-se de Jesus quando este se encontrava no território da Judéia, lugar onde fora batizado antes de iniciar seu ministério, a leste do Rio Jordão, procurando obter um passaporte com visto para a eternidade.
Pode-se observar nas palavras iniciais daquele jovem que ele não conhecia Jesus – embora que talvez já tivesse ouvido falar dele, e nem tinha conhecimento de que, na Sua Onisciência, Ele sabe tudo o que se passa no coração do ser humano. Por outro lado, a resposta que recebeu demonstra muito bem que o Mestre não se deixa mover por palavras lisonjeiras, mas que lhe é agradável aquele que guarda os seus mandamentos, como registrado no Evangelho Segundo João 14.21. Baseado nesse pretenso desejo de alcançar a vida eterna, o jovem vai tentar mostrar a Jesus que tem qualidades que o fazem digno de entrar no céu.
Naquele contexto histórico, o homem que possuía riqueza, normalmente fazia parte da Seita Religiosa dos Fariseus, que observava a Lei e achava que ela, por si mesma, era potente e suficiente para salvar um indivíduo. Assim sendo, as questões que envolvem fé e adoração a Deus eram coisas não cogitadas, embora fossem – e ainda sejam – justamente, as necessárias. Talvez fosse esta a situação daquele jovem que procurava enaltecer suas qualidades diante de Jesus.
O diálogo entre ambos alcançou seu apogeu – e também seu final, quando o tal jovem não conseguiu divisar a profundidade do Evangelho e afastou-se entristecido diante do fato de que era necessário desprender-se das coisas materiais.
O homem do nosso tempo tem agido de forma parecida: a necessidade de ganhar mais, o desejo de angariar maior quantidade de bens materiais aumentando o conforto para os seus e a ambição do status social, o têm levado para longe de Deus, muito embora o que externe seja uma intensa sede de paz interior e o desejo de viver para sempre. Às vezes, estriba-se nas qualidades que supõe possuir, as quais não são suficientes para realizar os desejos do seu coração.
Aquele jovem errou em várias situações, as quais vieram a ser promotoras do seu afastamento. Ele iniciou a conversa apoiando-se na adulação que as palavras podiam fazer, cometendo seu primeiro erro, uma vez que Jesus não dá atenção a esse tipo de coisa.
Quantas vezes encontramos pessoas tentando ganhar o Reino dos Céus por meio de palavras eloquentes... No texto registrado no Evangelho Segundo Lucas 18.9-14, Jesus conta a Parábola do Fariseu e do Publicano. Aquele, legalista. O outro, um homem que se reconhecia pecador. Ali, Jesus demonstra que não são as palavras que fazem a diferença, mas um coração contrito. Os homens pensam que podem lisonjear Deus por meio de palavras. Mas como, se Ele conhece a intenção do coração, como escrito na Carta aos Hebreus 4.12 “Porque a palavra de Deus é viva, e eficaz, e mais penetrante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até à divisão da alma, e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração.”?
No Evangelho Segundo Mateus 6.5-8 Jesus, em Sua prédica com respeito à oração, lembra que não é pelo muito falar que o homem será ouvido “E, quando orares, não sejas como os hipócritas, pois se comprazem em orar em pé nas sinagogas e às esquinas das ruas, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam o seu galardão. Mas tu, quando orares, entra no teu aposento e, fechando a tua porta, ora a teu pai, que vê o que está oculto; e teu Pai, que vê o que está em oculto, te recompensará. E, orando, não useis de vãs repetições, como os gentios, que pensam que, por muito falarem, serão ouvidos. Não vos assemelheis, pois, a eles, porque vosso Pai sabe o que vos é necessário antes de vós lho pedirdes.” Ainda, o Apóstolo Paulo falando aos Coríntios na Primeira Carta, diz que “O Reino de Deus não consiste em palavras, mas em virtude” – 4.20.
Sabendo-se que as palavras nem sempre conseguirão traduzir com fidelidade aquilo que a pessoa pensa, o que conta para Deus é o ser, não o que a pessoa diz. É bom nos lembrarmos disso. Aquele jovem cometeu o grande erro de achar que podia impressionar Jesus à força de suas lisonjas. Suas palavras revelaram-se vazias.
Vendo-se batido na sua primeira tentativa o jovem, então, apelou para o seu conhecimento da Lei, o que veio a traduzir-se no segundo erro, pois Jesus não se impressionou também com isto.
O Livro do Êxodo, no capítulo 20, narra o Código de Leis dado aos hebreus, conhecido como “Os Dez Mandamentos”, onde estão citadas as palavras de Jesus no texto em foco, as quais aquele jovem deveria guardar. Porém, quando Jesus lhe disse “guarda os mandamentos”, ele lhe perguntou: “Quais?”.
Ora, é conhecido que na história dos judeus, o jovem era ensinado por seus pais até os onze anos sobre toda a Lei do Deus de Israel. Tal pergunta demonstra que, não havendo alcançado sucesso por meio das palavras, o jovem mudava de tática: vencer por meio da argumentação intelectual, o conhecimento da Lei. Logo contra quem? Alguém que, aos doze anos, encontrou-se assentado junto aos Doutores da Lei, perguntando e dando-lhes respostas, e os impressionava por sua inteligência e habilidade nas Escrituras.
Quantas vezes encontramos pessoas que, ao ouvirem as palavras do Evangelho, logo se põem a enumerar as coisas das quais se abstêm, como que a demonstrar conhecimento da Lei, dizendo não fazerem isto ou aquilo, ou serem comportadas na sociedade, etc. Sua argumentação logo se esgotará, uma vez que sua abordagem se tornará vazia, tal qual daquele jovem, que logo se dissipou. Jesus não se deixa impressionar pela demonstração de conhecimento humano, haja vista estar infinitamente acima disto.
Não se dando por vencido ainda, o jovem partiu para sua terceira investida apoiando-se na riqueza que possuía. Este é outro ponto no qual os homens se têm apoiado ao longo da história da humanidade. Têm devotado grande valor aos bens materiais, achando que podem fazer deles seu abrigo seguro.
É certo que ele possuía grande riqueza. Talvez tivesse muitos escravos e funcionários a seu serviço. Talvez fosse bastante destacado em sua sociedade e no seu meio religioso. Mas Jesus resolveu pôr fim aos seus argumentos, tocando no ponto crucial da questão: mostrou-lhe que aquele que vive preso aos bens materiais não tem condições de estar livre para servir a Deus. Na verdade, o jovem estava agora pleiteando sua entrada no Reino do Céu à força de sua riqueza.
No texto de Mateus 6.19-21, Jesus diz: “Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam. Mas ajuntai tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam, nem roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração.”. Ele nos lembra que o coração do homem estará sobre aquilo que se constituir um tesouro para ele. Por outro lado, diz que se alguém deseja ir após Ele, deve renunciar-se a si mesmo, tomar a sua cruz e segui-lo – Mateus 16.24.
O ser humano jamais poderá conseguir a vida eterna por meio de coisas materiais porque também ele não é feito do que é material. A vida eterna consiste em o ser estar junto com Deus por toda a eternidade e somente se consegue isto quando há a disposição de guardar e viver os preceitos exarados por Ele enquanto na vida terrena. Não se consegue com bens materiais porque não é algo que se possa comprar, mas que se ganha como um presente de Deus. Não por merecimento, mas pela misericórdia dele. Portanto, é desejável que nos desprendamos das coisas do mundo e vivamos Cristo, se queremos entrar no Reino dos Céus. Jesus amou aquele homem. Ele nos ama também. O que importa agora é que o obedeçamos e o sigamos sem restrições, e nos será concedido o desejo do nosso coração – Salmo 37.4.
EVALD ROCHA